Heráclito, filósofo grego do século VI a.C., dizia que “a mudança é a única constante”. Em um mundo em que o conhecimento humano dobra a cada 12 horas e os ciclos de inovação se aceleram, essa frase nunca foi tão verdadeira. Mas, se a mudança é inevitável, a forma como a conduzimos faz toda a diferença.
Na prática, gestão da mudança é, antes de tudo, gestão do bem-estar das pessoas. Transformações organizacionais não falham apenas por falta de estratégia ou tecnologia — falham porque negligenciam emoções, tensões e limites humanos. Estudos mostram que cerca de 70% dos projetos de mudança não atingem seus objetivos justamente por ignorarem a dimensão humana.
A mudança começa pela saúde mental
Ambientes de alta pressão e sobrecarga cognitiva reduzem a capacidade de julgamento, memória de trabalho e controle emocional. Pesquisas em neurociência mostram que o estresse prolongado afeta diretamente o córtex pré-frontal, comprometendo decisões estratégicas e aumentando a impulsividade. Ou seja, sem cuidar da saúde mental, líderes e equipes perdem exatamente as competências necessárias para atravessar momentos críticos.
Três elementos-chave para liderar a mudança com impacto
- Comunicação clara e empática: transmitir o propósito da mudança de forma transparente e acessível, reduzindo a ansiedade.
- Envolvimento e participação: incluir colaboradores desde o início aumenta o engajamento e reduz a resistência.
- Capacitação contínua: desenvolver soft skills como empatia, resiliência e colaboração garante mudanças culturais mais sustentáveis.
Do discurso à prática: incorporando o bem-estar ao DNA organizacional
Não basta oferecer benefícios isolados. Empresas que prosperam em contextos de transformação são aquelas que integram saúde emocional à sua estratégia de gestão. Isso inclui políticas consistentes de RH, espaços de escuta ativa, programas de apoio psicológico e métricas de monitoramento contínuo do bem-estar.
Mais do que um gesto de cuidado, trata-se de um investimento direto em produtividade, inovação e longevidade organizacional. A ciência já demonstrou que ambientes psicologicamente seguros e emocionalmente saudáveis favorecem criatividade, engajamento e retenção de talentos.
O papel da ciência a serviço da gestão de pessoas
Ferramentas baseadas em ciência comportamental, análise de linguagem e indicadores de saúde mental oferecem hoje meios concretos para diagnosticar riscos psicossociais e apoiar decisões de gestão. Essa é uma tendência irreversível: medir bem-estar organizacional deixou de ser opcional e passou a ser uma exigência ética, estratégica e — cada vez mais — legal.
Conclusão
Mudar não é apenas reestruturar processos ou adotar novas tecnologias. É um exercício de cuidado coletivo. Organizações que reconhecem o bem-estar como pilar da mudança criam ambientes mais humanos, ágeis e sustentáveis. No fim das contas, transformar-se com lucidez significa entender que inovação só prospera quando as pessoas têm saúde, propósito e clareza para construir o futuro.
Até o próximo insight para transformar vidas, organizações e a sociedade.
Autores: Ruy Shiozawa e Pedro Shiozawa*
(*) Pedro Shiozawa é médico psiquiatra, doutor em psiquiatria pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo e especialista em pesquisa clínica aplicada pela Harvard Medical School. Atua como professor universitário e é cientista-chefe da Great People Mental Health.
Referências
- Shiozawa, R., & Shiozawa, P. (2025). Gestão da mudança é, antes de tudo, gestão do bem-estar das pessoas. MIT Sloan Management Review Brasil.
- Edmondson, A. C. (2019). The Fearless Organization: Creating Psychological Safety in the Workplace for Learning, Innovation, and Growth. Wiley.
- Gallup (2023). State of the Global Workplace Report. Gallup.
- Arnsten, A. F. T. (2009). Stress signalling pathways that impair prefrontal cortex structure and function. Nature Reviews Neuroscience, 10(6), 410–422.
- Organização Mundial da Saúde (2020). Mental health at work: Policy brief. WHO/ILO.