Há décadas sabemos que a ciência gera conhecimento capaz de transformar empresas e sociedades. O problema é que essa transferência ainda é lenta: pesquisas mostram que evidências científicas levam, em média, 17 anos para chegar à prática organizacional. Ou seja, muitas empresas continuam aplicando soluções do século passado.
Vivemos ainda sob o “ciclo da empolgação”: abraçamos modismos e hypes enquanto conhecimentos sólidos permanecem subutilizados. Resultado: investimos em novidades virais e deixamos de lado evidências robustas que poderiam melhorar a vida das pessoas.
É hora de mudar esse jogo. Colocar ciência e negócios na mesma frase pode acelerar o desenvolvimento. Mais que parcerias pontuais, precisamos de um fluxo contínuo de diálogo entre pesquisadores e líderes: aproximar pesquisa da prática, levar neurociência à gestão, medir confiança e sobrecarga cognitiva com métodos científicos e traduzir dados em ações humanizadas.
Obstáculos que ainda nos separam
Nas empresas:
- Cultura tóxica: microgerenciamento, medo do erro, ausência de diversidade e escuta.
- Falta de propósito: sem clareza do “por quê”, não há engajamento.
- Baixa confiança: sem confiança, ninguém se arrisca a propor o novo.
- Prisão do sucesso: Kodak e Xerox perderam relevância ignorando suas próprias inovações.
Na academia:
- Linguagem hermética e pouco acessível.
- Incentivos desalinhados: foco em publicações, não em impacto prático.
- Lentidão: trabalhos confinados a periódicos, sem chegar ao mercado.
A solução passa por abrir a academia para perguntas reais das empresas, adotar métodos ágeis (ensaios em campo, ciência cidadã) e estimular gestores a buscar na universidade não apenas conhecimento, mas também rigor científico para validar hipóteses.
Por que vale a pena atravessar a ponte?
Todos ganham:
- Pessoas: ambientes mais saudáveis e decisões baseadas em dados e empatia.
- Organizações: inovação menos aleatória, mais fruto de experimentação rigorosa.
- Sociedade: soluções em saúde, educação, sustentabilidade e bem-estar mais rápidas e efetivas.
Casos concretos já existem: a neurociência avançou no entendimento do estresse e da saúde mental; a economia comportamental ajudou bancos a reduzir inadimplência e ampliar inclusão financeira.
Como dar os primeiros passos?
- Diagnostique sua cultura: confiança, segurança psicológica e espaço para o erro.
- Aproxime-se das universidades: grupos de pesquisa, inovação aberta, estágios e laboratórios corporativos.
- Transforme dados em histórias: traduza métricas científicas em ações que façam sentido para as pessoas.
- Cuide de quem constrói a ponte: tempo, treinamento, mentorias cruzadas e celebrações de conquistas.
Inovar não é sobre a última buzzword. É sobre usar conhecimento disponível para melhorar vidas, organizações e sociedades.
Até o próximo insight para transformar vidas, organizações e a sociedade.
Referências
- Lane, J. P., & Flagg, J. L. (2010). Translating three knowledge translation strategies into practice: A pilot study. Implementation Science, 5(1), 69.
- Christensen, C. M. (1997). The Innovator’s Dilemma: When New Technologies Cause Great Firms to Fail. Harvard Business School Press.
- Edmondson, A. C. (2019). The Fearless Organization: Creating Psychological Safety in the Workplace for Learning, Innovation, and Growth. Wiley.
- Camerer, C., & Loewenstein, G. (2004). Behavioral economics: Past, present, future. Advances in Behavioral Economics. Princeton University Press.
- McEwen, B. S. (2007). Physiology and neurobiology of stress and adaptation: Central role of the brain. Physiological Reviews, 87(3), 873–904.